A fome emocional é um transtorno alimentar, um distúrbio emocional classificado pela Organização Mundial da Saúde. Trata-se de uma doença “invisível”, ou seja, que não se manifesta socialmente, assim como a bulimia, a anorexia e a síndrome do comer noturno.
É comum que a ansiedade, o estresse e outras situações extremas aumentem artificialmente o apetite. Comer sem sentir fome real é comum. Muitas vezes, esta situação é provocada por um vazio emocional, que pode ocorrer logo pela manhã, ao acordar.
Em geral, porém, os relacionamentos – amores, filhos, amigos – nos despertam para a realidade e, depois de alguns instantes, despertamos para a vida. Às vezes, “nós exageramos na dose” e comemos mais do que o necessário, mas sempre é possível corrigir o problema ao longo do dia.
Fome demais
Os portadores da fome emocional, no entanto, não conseguem corrigir o problema. Engordam, desenvolvem os muitos problemas derivados do sobrepeso e da obesidade e, principalmente, sofrem muitíssimo. O problema é real, mas quase sempre é subestimado, como ocorre com a maioria dos transtornos mentais.
A fome emocional, obviamente, está relacionada às emoções – e à maneira com que lidamos com ela. Especificamente entre as mulheres, as variações hormonais decorrentes do ciclo menstrual (e também da gravidez) atuam na instalação e desenvolvimento do distúrbio.
Estudos indicam que, a partir da 12ª semana de gestação, o controle hormonal deixa de ser feito pelos ovários, sendo transferido para a placenta. Isto leva a oscilações do humor a também a alterações na percepção dos aromas, do paladar e das preferências alimentares.
O lado emocional também contribui para a fome estranha na gravidez. A grávida fica mais sensível e pode passar a requerer atenção de quem está à sua volta. Ao ter um desejo alimentar atendido, por exemplo, a mulher sente atendida a sua necessidade de continência, de pertencimento. Em geral, porém, os desejos estranhos cessam com o parto.
Controlando a fome
O estresse do dia a dia pode ser responsável por ataques regulares à geladeira, especialmente à noite. Isto cobra um preço: o ganho de peso. Portanto, deve ser combatido. Além das questões estéticas, sobrepeso e obesidade acarretam uma série de problemas de saúde, como hipertensão arterial, hipertrofia ventricular, apneia do sono, depressão e diabetes tipo 2, entre outros.
A verdade é que nem sempre comemos apenas quando sentimos fome. Por uma questão cultural, a alimentação está vinculada inclusive aos relacionamentos sociais. Além disto, a natureza foi sábia: para impedir que nós morramos de inanição, o apetite sempre esteve ligado a sensações de prazer e de bem-estar.
O problema é que, quando se trata de fome emocional, a saciedade é um estado apenas transitório. Por um lado, proporciona a sensação provisória de alegria. Por outro, é um gerador de culpa, que só faz aumentar a sensação de incompetência: é uma verdadeira bola de neve.
Além disto, a fome emocional, mesmo inconsciente, é uma das principais responsáveis pela adoção de dietas malucas – aquelas propostas inviáveis, com absurdas restrições alimentares, que garantem rápidas perdas de peso, logo revertidas: o efeito sanfona, que prejudica a saúde e fomenta uma enorme insatisfação.
Qualquer pessoa pode sentir fome emocional. Se você já devorou, em poucos segundos, uma barra de chocolate ou uma torta de morango em um momento de raiva ou de frustração, é porque estava dominado por esta sensação. O problema é quando isto passa a ocorrer constantemente, de forma cada vez mais descontrolada.
As causas
A doença – sim, trata-se de uma doença – é causada por uma anomalia em nosso sistema de recompensa, o núcleo accumbens (NAC, ou nucleus accumbens septi, ou núcleo encostado à divisória), órgão do cérebro relacionado à geração do prazer, impulsividade e comportamento maternal.
Em nosso processo evolutivo, o prazer tinha como função primordial aumentar as probabilidades de sobrevivência dos indivíduos. As fontes de prazer incluíam até mesmo a preservação da espécie. Entre elas, estão: a ingestão de comidas calóricas, dormir bem, dominar habilidades como caçar e acender o fogo, obter apoio sexual e fazer sexo.
Atualmente, o núcleo accumbens é ativado por qualquer atividade prazerosa, mesmo sem estar relacionado à sobrevivência: dança, livros, jogos, músicas e filmes. O órgão é especialmente superativado por drogas sintéticas, como as anfetaminas e a heroína. Estas drogas viciam rapidamente e podem explicar a fome emocional – de uma forma ou de outra, uma “muleta” que suporta as nossas carências.
Em outras palavras, a fome emocional surge como fuga de um problema. O açúcar se torna a “droga” para escapar de diversos problemas – da falta de dinheiro para pagar a conta de luz à compensação por ter perdido um namorado, ou coisas mais sérias, como um aborto espontâneo ou a perda de um ente altamente representativo em nossa vida.
Os sinais
A fome emocional é um problema real, com características extremamente limitantes. No entanto, ela pode ser tratada com sessões de psicologia comportamental cognitiva e, se for o caso, com tratamento medicamentoso. São sinais do problema:
• exagerar na comida (especialmente doces e salgadinhos) em situações de estresse;
• perceber que está sem controle sobre a alimentação;
• continuar comendo quando já está saciado;
• comer para se sentir melhor (não confunda com situações triviais, como tomar uma casquinha em uma tarde de Sol);
• sentir que está recompensado com a comida;
• fugir dos conselhos de amigos, recompensando-se com a comida.
Vale lembrar:
• a fome física surge gradualmente e pode ser controlada. A fome emocional surge repentinamente e torna-se imperativo saciá-la;
• a fome física sugere opções: é possível deter-se à frente de uma fruteira, escolhendo uma das frutas. A fome emocional gera uma necessidade imediata, geralmente relacionada ao consumo de alimentos calóricos (nada contra uma coxinha ou empada, mas é necessário controlar o consumo);
• a fome emocional não é saciada pelo estômago cheio. Ao contrário, ela vem acompanhada por sinais de vergonha, culpa e sensação de que “passou dos limites”.
Libertando-se
O primeiro passo é identificar os sinais que disparam a fome emocional (que podem ser muitos: da insatisfação com um namoro ao mau comportamento de um filho, por exemplo). Alguns ambientes positivos podem estar na gênese do problema: observe os possíveis exageros em festas ou em encontros sociais.
Raiva, medo, ansiedade, tédio, tristeza, solidão e vergonha são algumas causas da fome emocional. Aprenda a lidar com estas sensações de maneira mais positiva. Todos nós estamos sujeitos a estas situações no dia a dia.
Faça um diário alimentar: ele será útil para identificar os momentos em que surge a fome emocional. Podem ser momentos de depressão, angústia, cansaço ou tédio. É necessário combater os motivos – uma dieta alimentar nunca iria funcionar nestas situações.